terça-feira, 5 de março de 2013

Autocriticaferrenha

Às inocentes ignorâncias, às despropositadas desvalorizações, aos descuidos paternos e maternos, à cegueira e à surdez alheia ofereço um gélido e apático olhar frente aos afetos. Ofereço-lhes um falso e desdenhoso olhar, um olhar vazio, que se desimporta meio ao carinho. Um olhar só, que deve produzir compaixão, pena e distância pra quem, inocentemente, desconhecendo seus próprios espinhos e venenos, vem pedir-me um abraço, um ombro, uma cumplicidade. Um olhar de origem puramente egóica, orgulhosa, maquiavélica, um olhar que me faz esquisito e me projeta a uma distância maior ainda, quando o que mais queria, intimamente, era ser acolhido e compreendido, ser abraçado, ser igual, a minha maneira, como todo ego quer. Olhos frios, secos. A última coisa que sou nos momentos em que olho assim é frio, pelo contrário, fervo por dentro e estou vulnerável a cada palavra que me disseres. Olhe mais tempo e verás o quão trêmulos estão os meus olhos para conseguirem manter essa postura toda, essa seriedade, essa severidade. É porque em verdade estou muito fraco nas horas em que olho assim, e me é difícil mantê-los tão firmes. O que eu queria nesses momentos era pedir socorro, pedir piedade, pedir mais voz, pedir espaço, pedir força... Reconheço todas as não virtudes e, principalmente, as infantilidades e vaidades desses pedidos, mas que fazer com esses anseios? Devo mesmo escondê-los? A última coisa que quero ao me retirar é ser esquisito, por vezes me retiro para não continuar sendo esquisito, mas o efeito não sai como calculado...Não que me importe ser ou não ser esquisito, ser ou não ser normal, inclusive, ser normal - igual, padronizado e etc - é para mim repugnante. O que me importa, e duvido que a alguém não importe, é ficar só. Não me refiro à mera solidão material, que muitas vezes pode até ser gostosa e saudável-quando passageira-, mas sim ao cruel e insustentável estado de desamparo, recheado de carências e de dilemas- dos profundos aos rasos-, a que são sujeitos alguns homens postos de lado. Me refiro à triste sensação de se perceber incompatível com a sociedade e com nem um homem sequer, à tristeza de ver o isolamento como imperativo e irremediável, como um destino. Me refiro à sensação de despertencimento, que, segundo Durkheim, leva vários homens à navalha. Esse isolamento não é voluntário, é fruto de complexas, profundas e antigas relações pessoais, é fruto de fortes vícios e, principalmente, é fruto da ignorância. Um isolado exigindo do mundo uma paciência que não tem para com ele; exigindo dos outros uma compreensão que não possibilita, pois exibe os olhos bravos para os momentos de fraquezas e os olhos frios para os momentos de carência; negando o afeto que mais deseja; e dificultando o acolhimento que mais procura. Isola-se quando tudo dentro de si implora por comunidade.

Isso tudo sem mencionar a ignorância já presente na raiz do problema, o sentir-se desvalorizado, quer algo mais vaidoso? Assim segue o ego, como a maior vítima de si mesmo...

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